deixas que te estraguem as palavras deixas que as palavras te estraguem deixaste-as gastarem-se em tempo deixaste que o tempo as gastasse pousadas na ferrugem velha de um chaveiro para ali atiradas rendidas ao passar de dias que não passam dias de outrora perdidos no canto esquecido da memória deixas que ali sequem deixas que te sequem em linhas salgadas no rosto deixas que arrefeçam deixas-te arrefecer no murmúrio inaudível das gentes que não são tuas das gentes que não querias ser deixas e aos poucos para trás te deixas deixas que amarguem e que te amarguem deixas que esqueçam e que te esqueçam e em passos por demais pequenos deixas que deixem de ser deixas apenas de ser.
do It. sbozzo s. m., delineação inicial de uma pintura, escultura ou desenho; bosquejo; fig., resumo; sinopse.
4.12.12
deixas que te estraguem as palavras deixas que as palavras te estraguem deixaste-as gastarem-se em tempo deixaste que o tempo as gastasse pousadas na ferrugem velha de um chaveiro para ali atiradas rendidas ao passar de dias que não passam dias de outrora perdidos no canto esquecido da memória deixas que ali sequem deixas que te sequem em linhas salgadas no rosto deixas que arrefeçam deixas-te arrefecer no murmúrio inaudível das gentes que não são tuas das gentes que não querias ser deixas e aos poucos para trás te deixas deixas que amarguem e que te amarguem deixas que esqueçam e que te esqueçam e em passos por demais pequenos deixas que deixem de ser deixas apenas de ser.
9.11.12
30.9.12
não sou, isso sei-o, o que esperas. não o sou com uma força tão imensa como se apenas existisse para o não ser. correu-nos a vida ligeira até ao pingo do tempo onde muda e quieta como se eterna se nos mostra imóvel num frente a frente ali à frente ao largo de um toque, na infinita distância de um abraço partido, no amargo travo a sonho perdido. imóveis num frente a frente quieto e mudo. cai-me nas mãos o olhar que não me atiras ou talvez atires já não importa. e sem amarras seguro-o no junto das palmas na concha das mãos onde se aninha como em casa. não o espanto nem o guardo. fetal e sereno nas palmas se queda, nas palmas se deixa ficar. seguro-o longe do que esperas. sei não o ser como te sei a dor na alma. o pesar encastoado na alma arraigado no rafado de um forro de algibeira. por demais quieto em concha segurado o seguro repouso do teu olhar. vais em breve chorar e sabe-lo. e sei-o quieto contigo e imóvel me quedo. vais chorar e vai doer e como eu sabe-lo quieta e quieta comigo te quedas no desequilibrado balanço da estatia do momento. ali – crua e fria - de alma caída no fundo esquecido de um alforge atulhado de prantos e olhar repousado no esquizofrénico carinho de um louco…
29.9.12
morres a cada dia um pouco mais a cada instante sem que disso te dês conta. morres devagar porque amas e porque amas não se te morre todo o ser só num momento. porque o amor é vida é indissociável da morte da mesma forma que estas se não desligam. é condição de existência da vida do amor não se poderem dividir em partes. o todo faz-se das partes sem que nenhuma per si o complete. quem ama como quem vive fá-lo por inteiro ou vive na ilusão de o fazer. amar é beber a vida na felicidade do ser amado é ocupar a existência a construí-lo complementar-lhe o ser e deixar a vida acontecer-lhe.
e quando recíproco torna-se a vida plena em cada ser e a morte não é mais que a plenitude da própria existência
28.4.12
é daqui que o verbo se vê. e é daqui que se vê tanto… de onde sem artifícios sem que valham artes ofícios emerge detrás do olhar e preso nos lábios no rosto apaga atrições e desgostos e pára o tempo no ar. vê-se sempre que é de dentro sempre que o corpo encolhe e assiste – conato desejo - num rompante num lampejo a alma rasgar o molhe saltar muros barreiras raias paredes fronteiras imposta à carne rendida às pernas já frágeis tremidas a todo o batuque do peito aos olhos brilhantes ao jeito ao sorriso à comoção transborda da pele pra fora enguiça-se noutro peito e sem sentido nem jeito nem forma de ser ou de estar rasga o sorriso perfeito de quem o vê conjugado quem sem destino nem fado nem nada que ter e que dar se sente por todo um tanto tido todo como dado querido em gosto estimado e noutro peito a morar…
o verbo inundado de mar *
15.3.12
23.2.12
As asas geladas de frio. Passo a passo num disfarçado pairar ergue-se a luz caída em manchas na calçada. Passo a passo entre foscos mergulhos de tempo e as asas presas de frio. Do frio que mastiga ossos. Do pálido escuro da noite um precipício de céu. Cristais que podiam ser sonhos. Tão perfeitamente gelados. Esculpidas em plumas. Um perfeito bailar de sonhos. Pequenas farripas de céu. E um silêncio maior que o mundo arremessado pelas fachadas atropelado por sombras a cada fosca mancha de tempo. E sob o pairar sonhos aos montes. Empilhados por todo o lado imersos no frio caiam a noite. As asas vítreas - frágil plumagem. Inutilmente belas. As mãos fechadas em si cheias de si. Braços tombados punhos gelados ensombrado pairar. Gritos estourados contra as fachadas cortantes calados por todo o escuro da noite. Esculpidas a frio. Os olhos presos no alto. Sentidos a cada passo em disfarçado pairar. Segue a dança cresce o manto sem que o olhe sem que o toque. O baile ali. Embalado quando em quando em baços sopros de luzes presas por vidros fartos de tempo. Foscas manchas, precipitados palcos de sombra. Esporas de frio algemas de gelo. A cada passo um pairar de retrato intemporal. O frio coberto na alvura do manto estendido em deslizante bailado na quietude nocturna. A existência em veemente volúpia. Niveal. Florescida. Incendiada de espanto, um tudo todo tão inteiro, tão maior que ser. Incrível fonte de sonhos. Alvas enormes. Envoltas de frágil cristal. Enormes ávidas de nova vida outros voos outras paragens. Lá longe no alto para lá do início das danças espectaculosa imensidão de sentidos.
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